TEMPO CONGELADO POR UM BURACO NEGRO
Deixando a espaçonave em órbita a uma distância segura de centenas de milhares de quilômetros do buraco negro, bem longe de sua garra, Jules se transfere para uma pequena cápsula especialmente desenhada para explorar a vizinhança da superfície do horizonte. Ele sabe que tem que proceder com extrema cautela. Uma manobra falsa, e ele pode terminar em queda livre em direção à boca gulosa do buraco negro, jamais para ser vista ou ter notícias dela novamente. Seu plano é se aproximar do horizonte numa espiral, dirigindo sua cápsula numa órbita circular crescentemente mais restrita. Para isso ele inicia uma série de pequenas freadas. A primeira delas amortece seu movimento orbital inicial suavemente – a primeira que a cápsula compartilhou inicialmente com a espaçonave – e lhe habilita mergulhar numa órbita circular mais baixa, mais próxima ao buraco negro. Com uma segunda leve freada, a órbita se torna ainda mais estreita, e assim por diante.
À medida que ele desce à superfície do horizonte do buraco negro, Jules permanece em contacto com seu amigão Jim na Terra. A princípio, ainda longe do buraco negro, tudo parece normal. O tempo flui na mesma taxa para ambos amigos. Jim pode verificar que também é assim vendo as imagens de TV do relógio de Jules dentro da cápsula espacial. Mas na medida que Jules fica cada vez mais próximo do buraco negro, os sinais que ele envia a Jim têm uma crescente dificuldade para ficar livre do espaço distorcido pela forte gravidade. Os sinais de rádio perdem cada vez mais energia para escapar da garra do buraco negro. As figuras enviadas por Jules se tornam menos freqüentes e são atualizadas menos ainda no monitor da televisão de Jim. Este tem a impressão nítida que o tempo de Jules está se atrasando cada vez mais. Para se barbear, Jules em princípio leva um minuto, depois uma hora, um dia, então um ano pelo calendário de Jim. Jules exibe a mesma desenvoltura juvenil, a mesma vibrante cabeleira negra, e a mesma face lisa, enquanto a velhice está causando estrago em Jim, seu cabelo se tornando branco, seu rosto sendo invadido por inumeráveis rugas. Até onde Jim pode dizer, tudo em relação a Jules procede a passo de cágado. Mesmo suas faculdades mentais parecem ter diminuídas. Leva uma eternidade para Jules tomar a menor decisão.
A percepção de Jules da situação não é diferente da de seu amigo. Ele também observa que o tempo de Jim flui muito mais rápido do que o seu. As imagens de televisão enviadas por Jim da Terra capturadas pela forte força de gravidade pelo buraco negro alcançam a cápsula espacial cada vez mais rápidas e são renovadas numa vertiginosa taxa na tela de bordo da espaçonave. Enquanto Jules gasta nada mais que alguns dias descendo em direção ao horizonte do buraco negro, ele observa Jim na tela comemorar seu quadragésimo, qüinquagésimo, sexagésimo, septuagésimo, etc, aniversário. Com um ar de tristeza e o coração triste, ele vê seu velho amigo se tornar cada vez menos alerta e com crescentes problemas de saúde. O tempo voa mais rápido para Jim do que para Jules porque a situação não é simétrica entre os dois amigos. Jules experimenta os efeitos gravitacionais desagradáveis do buraco negro, enquanto que na Terra, Jim está blindado deles.
Existem outras conseqüências do fato de que o tempo de Jules amortece. Quanto mais ele se aproxima do buraco negro, sua fala transmitida a Jim se alonga e sua voz se torna profunda e modulada, não diferente do som cavernoso que ouvimos no cinema quando o fita freia e o projetor range ao parar. Por outro lado, Jules não nota qualquer coisa de anormal. Do seu próprio ponto privilegiado, tudo parece decorrer normalmente. Ele envelhece na mesma taxa como antes, suas faculdades mentais estão afiadas, e sua voz mantém o mesmo tom. Ao contrário, é a voz de Jim que aparece grosseiramente distorcida. Ela se torna crescentemente aguda ao ponto de quase ferir seus ouvidos; as palavras se empilham a um passo tão rápido que elas se tornam incompreensíveis, semelhantes ao som de uma fita de áudio sendo avançada rapidamente.
terça-feira, 5 de agosto de 2008
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